quarta-feira, 22 de fevereiro de 2017

Lugar de mulher é onde ela quiser

I LOVE LAJE NO FOMENTO À CULTURA DA PERIFERIA

Breu! Ameaçou o toró e varreu o sintético do Umuarama.

Há décadas a várzea promove encontros entre times da periferia.

Durante a semana o percurso tradicional vai da perifa ao centro...

No fim de semana a várzea muda o trajeto na transversalidade das beiradas. 

No Centro Desportivo Uleromã, a Família Casarão e as Galáticas dos Álamos estiveram no campeonato Libertadores de Base...

...salpicando na borracha do sintético, gotas de chuva, suor e agilidade,

Jogaram assim mesmo. O time dos Álamos desfalcado. 

Perdidas pelo caminho três jogadoras...Só chegaram vinte minutos após o início do jogo...

...Não deu outra, vence Família Casarão. No entanto, aqui não é o resultado do jogo o que interessa.

O jogo do dia 12 em casa foi a desforra para a Família Casarão com a vitória de 9 a 2.

....emplacando também 3 a 2, no dia 19 de fevereiro contra o Tudo a Ver F. C.

Como correspondentes da rede do blog Futbolando, tanto Brenda como Naty agora começam a atuar enviando notícias do time. 

Então agora vale a lição que o papo com Lurdinha, a técnica das Galáticas, nos deu.


Lurdinha - Lidar com ser humano em si é muito difícil, independente de ser homem ou mulher.

A mulherada em si...Acho que na questão do futebol é tudo muito novo ainda.

Embora a gente já tenha aí uma seleção brasileira, já é um exemplo, mas pra gente, pra mim, pra minha equipe ainda é aprendiz.

Falo sempre pra elas. A gente é aprendiz. Até porque a maioria dessas meninas minhas aqui, elas tão tudo nova, entendeu? 

Então não tem experiência. Uns quatro meses só de treino. Problemas? Um monte de coisas...são dificuldades!

Insisto - E quais são as dificuldades?
" Disciplina, né? Entrar num campo. Postura, tá?Preparação psicológica e física.

 Então eu sento, eu converso, quero saber se têm problemas. Em que eu posso ajudar, analiso...

...Cê tá bem? Tá tudo bem? Eu verifico a pressão. Elas me chamam de "tia"e dizem:

- a tia, ela é meio doidinha...

...mas não é. Eu quero ver boletim da escola, quero reunião com os pais cada quinze dias...

Tenho o telefone de pais e mães. Aviso que hora é o treino, que hora que chegou, que hora que saiu...porque a mulherada é danada!Entendeu? 

Então assim, são aqueles problemas que pra mim é uma coisa que dá muito...muito trabalho. 

Tive que cortar muita menina. Eu tenho trinta menina. Tava com 35...Pru cê tê ideia, neste último semestre do ano passado, quando acordei, eu tava com 7 menina expulsa da escola. Eu. 

A mãe não sabia, o pai não sabia...Eu tive que ir lá. Mas acertou. Falei com a diretora. 

...Trabalho na comunidade desde 82. Sou da Associação de bairro...É meio complicado...a criação de cada uma delas. 

Uma vem e  mente pra você e vai jogar em outro time... Começa aqui agora, aí pula pra lá."

Alai - E tem algum apoio?

-"Você não tem noção. Eu tô com as camisa dos menino. A gente tá se unindo pra fazer um bingo, uma rifa...Agora é que vô encomendá o uniforme delas. O oficial, com nosso nome. Tô querendo registrá o time também, né?"

Marco Pé (pergunta) - E por que Galáticas?

"- Na verdade, Galáticos é nome  de um time masculino que eu treinava. Aí as meninas começaram a entrar para o treino...

E daí queriam jogar pra valer. Aí eu falei, vamos fazê as Galáticas, time feminino e foi assim que começou tudo."

Ao final da partida, Lurdinha manda um discurso carregado de sabedoria: 

"Quero agradecer a Deus e a toda equipe pela abertura. Cada dia, cada jogo é uma experiência. Com todas as dificuldades.A gente não tem patrocínio...

Primeiramente é a humildade, o respeito e a dignidade. Parabéns!"

O tempo de quatro horas para viajar dos Álamos até o Jd Umuarama daria pra rodar 300 quilômetros numa estrada... mas entre os dois barros são somente 30, 3 kms, a condução escassa aos domingos, daí a demora.  

Periferia vive na constante falta de direito ao lazer. Domingo rareia o buzo, e o metrô. A espera nocauteia o tempo e a gente perde em
qualidade de vida. 

É apoio mesmo que falta também ao futebol feminino na várzea.  

E ao final, vale a pena recuperar a fala de Lurdinha, citando um amigo da Liga: 

"- Hoje em dia, lugar de mulher é onde ela quiser."



Entrevista com Lurdinha, técnica das Galáticas

Reportagem e fotos Alai Diniz, Marcos Vellasco e Marco Pezão


Esse projeto foi contemplado pela 1ª edição do Programa de Fomento à Cultura da Periferia da cidade de São Paulo 
              
DO CAMPO LIMPO AO SINTÉTICO

POESIA SEM MISÉRIA

A VÁRZEA É VIDA

PARTICIPE!




Grito milenar da Banda Espera Marido

I LOVE LAJE NO FOMENTO À CULTURA DA PERIFERIA 

Viva a alegria nessa nesga do mundo, chamado Maria Rosa,
em Taboão da Serra!

A menina, de ensolarado sorriso, em sua fantasia, olha, de frente, o mundo, sem barreiras, nem preconceitos. 

À direita, de outra geração, alguém  também se veste de fada, com a varinha de condão dos 25 anos da Banda Espera Marido.

É Santão, superlativo de santo. Firmeza no olhar protegido dos raios solares. Compartilham ambos esse momento dionisíaco da festa. 

Seguidoras de Dionísio, as chamadas bacantes na Grécia não eram cidadãs. E por que elas seguiam o deus do vinho e da transformação?

Escapavam da violência dos pais, irmãos ou maridos indo ao seu cortejo. Nem tudo mudou, infelizmente!

Hoje, homens que se vestem de mulher, ousam contradizer os hábitos? 

De certa maneira, satirizam tradição; a ordem e o estereótipo do cotidiano. 

No Carnaval brinca-se com as relações de gênero e suas amarras. 

Como ritual de irreverência e transformação, o Carnaval libera o prazer.

O corpo masculino em trajes feminis torna caricaturais as diferenças do sexo e cria um estranhamento de peito e traseiro...

...pernas, barba, cosméticos e perucas. Peruas? Festa aos olhos da mulher.  

O ser humano tem a ousadia de rir de si e se transformar no ritual. 

Isso flexibiliza as interdições? Oxalá faça o mundo menos preconceituoso, menos violento, mais humano.

Entretanto, as mulheres também se divertem. Começo por Rose que conheci na Banda Espera Marido.

Começamos espontaneamente 
combinando passos de reggae e lá estávamos curtindo a brincadeira, quando passa alguém e  comenta com ela:

- Olha lá, hein, 
Rose, não vá perder a hora amanhã. Você entra às seis horas!

- Pode deixar!

E pra mim ela diz, sem parar de dançar:

- É meu patrão! 
Batalho lavando roupa de jogador. Tenho um filho de treze anos mas não sou nenhuma coitada, nem dependo de ninguém. Tá doido, seu, ainda tenho 12 horas de folga, entro só às 6 da manhã. Hoje o dia é meu!

A pedida era a dança e o repórter Marco Pezão também cai na folia sob a varinha da fada Santão.

Afinal, ali mudar o tempo do ser que trabalha para o ser que deseja (Octavio Paz) era o ritual.

Antiga moradora de Taboão da Serra, nos anos 80, e professora no Laurita, não conheci antes a Banda Espera Marido, iniciada em 1993.

Naquela época de tempos sombrios e filhos pequenos, não havia muito tempo pra curtir o Carnaval...

...e a vida passava por outras prioridades. 

Entretanto, agora, sexagenária, sem repressões, nem recalques, foi a primeira vez que estive no grito da Banda Espera Marido...

...e tiro o chapéu  como Rose.

A todos, ao cantor Nelson, demais instrumentistas e Santão, Pedrinho e organizadores vivos e finados, grata, pois quem foi pra rua do Maria Rosa naquele sábado,  grita!



“Não deixe o samba morrer!” 

Reportagem: Alai Diniz


Esse projeto foi contemplado pela 1ª edição do Programa de Fomento à Cultura da Periferia da cidade de São Paulo



DO CAMPO LIMPO AO SINTÉTICO

POESIA SEM MISÉRIA

A VÁRZEA É VIDA

PARTICIPE!