sábado, 27 de janeiro de 2018

Em 2018, o Sarau A Plenos Pulmões se renova e inova com a antologia

I LOVE LAJE NO FOMENTO À CULTURA DA PERIFERIA


A epígrafe "Não lamente, organize. Não se desespere, crie." do movimento negro norte-americano Black Lives Matter...

...serviu, há um ano atrás, para compartilharmos uma reflexão sobre o impacto que o Sarau A Plenos Pulmões, na Casa das Rosas, poderia sofrer com a quebra da temporalidade do evento - mensal para bimestral. Na verdade, agora é janeiro de 2018 e o último sarau foi em novembro de 2017

Entretanto, no sábado 13, abrindo a programação do ano, a surpresa foi ver como está desperto o interesse pela atual poesia.

O Mestre Geraldo Magela do Grupo Candearte, no Taboão da Serra, encara com seriedade sua participação, inovando suas composições, dando um colorido especial ao evento. 

Os saraus que, a partir de 2001, com o advento do Sarau do Cooperifa, foram se expandindo pela cidade de São Paulo, romperam a invisibilidade cultural no sistema literário com um formato aglutinador e democrático, não pré-determinado por padrões de mercado. 

Há quem venha da Casa Verde, Vila Maria, Jd. da Saúde, Jd. Olinda, Campo Limpo, Taboão da Serra, Paraiso, buscando na Casa das Rosas o ponto de encontro. 

O Sarau A Plenos Pulmões se renova a cada edição. Sempre há caras novas somando-se às amigas e conhecidas...

E a divulgação do material lírico diversificado e vocalizado impulsiona novas editoras, cooperativas e outros tipos de publicações independentes. 

Akani, acima na foto, acaba de publicar o seu primeiro livro de poemas Mente Aberta . 

Poesia é a arte de quem não tem idade. ( M. Pezão)

Tanto Marcelo, do coletivo Poetas do Tietê e pai de Akani, como Alexandre Paulino com as filhas, sabem que o carinho, o estímulo e a busca incessante da arte educa a voz, o olhar e o convívio inter-geracional.   

Assim a questão da vulnerabilidade ambiental e social; o racismo; o estupro, a violência de gênero, ou mesmo a policial passam a ter no sarau, talvez, o único espaço de desabafo e partilha do sensível que reivindica direitos de cidadania que vivem sendo usurpados daqueles que pisam o chão das periferias. 

Com uma acolhida cálida e democrática o Sarau A Plenos Pulmões vai cultivando novos espectadores que saem da passividade para o protagonismo...

revelando-se eclético,  tanto quanto à faixa etária, como no modo como se apresentam diante do público...

Seja com a graça de uma performance compartilhada com a cara e a coragem...

Seja com auxílio do dispositivo digital, acoplado ao corpo que serve ao ato desse lirismo oral, contundente na mão de Mariana Varela. 

Além de amigos que dividem a cena na explosão de  verdadeiros limeriks, como a lírica do casal ao fundo, Bispoeta e Elide...

...que partilha a densidade minimalista no uso do nonsense, marca da poesia contemporânea que os poemas breves dos Poetas do Tietê na voz coletiva performa com tanto refinamento...
  
A arte vocal do poeta angolano Emir Pando se combina às novas carinhas e gestos que multiplicam por dois a alegria do instante...

Há também figuras marcantes que, de longa data,  vestem a camisa do Sarau A Plenos Pulmões, como a poeta Zanir de Oliveira cuja poética está centrada na longevidade...

E que tanto nos enriquece nessa sua trajetória. 

Oliveira abre alas, rasgando o conforto da interioridade, dá voz  a jovens que, mesmo confinados socialmente, alçam voo em seus poemas.

Agora já é hora de arrematar a conversa, observando que, em 2018, o Sarau A Plenos Pulmões não se lamenta, mas retorna com o sonho de criar sua própria Antologia.

Para tanto, no sarau passado 43 poetas aderiram à ideia da coletânea. Com esse projeto a cartonera Semente Urbana fará sua segunda publicação...  

Intercalando oficinas entre os saraus, recolhendo os poemas para a confecção do livro, o coletivo irá criar seu próprio exemplar...

...onde cada um é todo mundo e todo mundo é cada um. 

Mas, afinal, o que vem a ser uma publicação cartonera?

O objeto livro aqui parte de um trabalho de sujeitos a serem valorizados na sociedade de consumo: os catadores. 

A matéria prima da capa é o papelão (cartón) e a elaboração  do livro transforma o que iria para o lixo em arte reciclável.  

A história do livro alternativo de papelão nasce após uma crise na Argentina. 

Com a desvalorização do peso no país vizinho, o governo de Fernando de La Rua restringe a retirada de dinheiro dos correntistas, congela as contas bancárias, deixa de pagar os aposentados, causando uma crise sem precedentes: o curralito.  

Desempregados, artistas se reúnem em 2003, e criam a Eloísa Cartonera, a fim de cavarem, coletivamente,  um modo de publicar suas obras.

Washington Cucurto, hoje escritor reconhecido internacionalmente, foi um dos artífices dessa editora em Buenos Aires que aliou catadores a escritores. 

Em um coletivo, mentes criativas, necessitadas de um meio pra sobreviver, transformaram um grande "papelão" do governo argentino em um ato ecológico inovador: a Eloísa Cartonera.   

Daí foi uma mão na roda.

Hoje a história do livro alternativo de papelão torna-se um movimento que se dissemina pelo resto do planeta. 

Aqui em São Paulo, um coletivo pioneiro é a Dulcineia Catadora, cuja coordenadora Lucia Rosa, é quem nos tem incentivado e apoiado muito. 

A todos aqueles que assinaram a lista e deixaram o endereço virtual, aguardem nossa mensagem após o Carnaval.

E para concluir, vale a pena lembrar de um dos frequentadores mais assíduos do Sarau A Plenos Pulmões.

José Correia, o poeta do canto pecuário, injeta ternura no aboio e fura as paredes da urbanidade...

...lembrando a Paraíba, da zona da mata do Mestre Mané de Bia,  em uma sonoridade que ecoa lá dos vaqueiros nos campos nordestinos...

Morador de Pirituba, Zé Correia é exclusividade dos saraus onde se apresenta...


Reportagem: Alai Diniz e Marco Pezão

DO CAMPO LIMPO AO SINTÉTICO

POESIA SEM MISÉRIA


A VÁRZEA É ARTE

A VÁRZEA É VIDA

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Esse projeto foi contemplado pela 1ª edição do Programa de Fomento à Cultura da Periferia da cidade de São Paulo